Em abril de 1967, um professor de História chamado Ron Jones, conduziu uma experiência com seus alunos de Palo Alto, na Califórnia, tentando provar a eles que regimes ditatoriais como o nazismo poderiam tranquilamente encontrar espaço em qualquer sociedade democrática do pós-guerra.
O trabalho acabou rendendo um romance escrito por Morton Rhue (pseudônimo de Todd Strasser) e uma adaptação para a televisão escrita por ele mesmo. Em 2007, o cineasta Dennis Gansel, cujo avô fez parte da juventude hitlerista, seduzido por suas promessas de proporcionar-lhe uma carreira artística, encontrou na narrativa de Jones o material ideal para um filme que demonstrasse, nas telas de cinema, sua ideologia contrária a qualquer tipo de fascismo. Nascia, então, "A onda", uma transposição honesta, forte e inquietante que estreou no Festival de Sundance de 2008 e, com um final mais impactante do que o livro e a história real, conquista o público com uma trama surpreendente e chocante.
O protagonista é Rainer Wenger (Jurgen Vogel), um carismático professor de história que, mesmo com planos de utilizar o conceito de anarquia para um projeto com seus alunos, acaba sendo obrigado pela direção a optar pelo seu exato oposto, a autocracia. Como forma de mostrar aos jovens que um regime autoritário não floresceu por acaso na Alemanha nazista, ele propõe a eles que formem um novo e rígido sistema político dentro da própria sala de aula, tendo-o como líder. A princípio tímidos e relutantes, aos poucos os estudantes começam a empolgar-se com a ideia, especialmente quando os mais introvertidos e problemático passam a experimentar o gostinho de pertencer a um grupo e os demais percebem a importância da união que surge entre eles. Porém, com o tempo, as coisas começam a sair do controle de Wenger: o uniforme obrigatório do grupo (batizado como "A onda") se transforma imediatamente em uma espécie de passaporte para um mundo com novas regras e leis, que exclui aqueles que não compartilham de seu pensamento, e, utilizando-se de seu logotipo como propaganda, alguns dos membros iniciam uma campanha para impor suas ideias. Sentindo que algo está muito errado, a jovem Karo (Jennifer Ulrich) - expulsa do grupo por não concordar com suas normas - tenta abrir os olhos do namorado, Marco (Max Riemelt), jogador de polo aquático que vê na turma de colegas o apoio que necessita para se tornar um atleta mais bem-sucedido.
Com um roteiro simples e direto, que vai envolvendo a plateia cada vez mais, conforme a experiência de Wenger vai saindo de seu controle, "A onda" é um filme alemão com um ritmo ágil e inteligente que dialoga muito mais com o cinema americano do que com produções europeias com pretensões artísticas. Apesar da questão cada vez mais relevante que apresenta para discussão, em nenhum momento o filme de Dennis Gansel se propõe a ser mais do que entretenimento acima de tudo. Para isso, não abre mão do suspense, do drama, de pitadas de romance e de um clímax arrebatador, que leva quase às últimas consequências a proposta inicial. Com uma direção correta, que não corre riscos desnecessários e conduz a narrativa de forma sóbria, "A onda" se apoia basicamente em sua empolgante premissa e em seus (bons) atores, Jurgen Vogel à frente: sem exagerar nas tintas de seu mestre apaixonado que vê seu experimento escapar de suas mãos de maneira trágica, Vogel não procura o brilho fácil, dividindo a atenção com um elenco de jovens intérpretes dotados de garra e carisma suficientes para manter o público ligado até as últimas cenas. Max Riemelt - que anos depois estaria no elenco da cultuada série "Sense 8" - é um dos destaques, como um rapaz dividido entre a fidelidade a seus colegas (e consequentemente à sua futura carreira no esporte) e a noção de que algo está muito errado nas regras propostas por seu líder.
Apresentando algumas sequências bastante interessantes visualmente - em especial no terço final, quando o diretor se utiliza do branco do uniforme do grupo para enfatizar a falta de individualidade dos personagens - e conduzido com discrição, "A onda" é um filme de suma importância nos tempos difíceis de obscurantismo e fascismo que vem tomando conta do mundo. Alertando para os perigos do totalitarismo, o belo trabalho de Dennis Gansel consegue aquilo que o bom cinema deveria conseguir sempre: entreter e fazer pensar, divertir e questionar. Pode suscitar muitas discussões e só por isso já deveria ser mais conhecido e louvado - mas além disso, é uma história interessante e bem contada, amparada por um roteiro sóbrio e um elenco esforçado. Imprescindível em qualquer momen
to histórico!
Fonte: Um Filme por Dia
Ficha Técnica
Título Original: Die welle
Direção: Dennis Gansel
Elenco: Jurgen Vogel, Frederick Lau, Max Riemelt, Jennifer Ulrich, Christiane Paul
Roteiro:Johnny Dawkins, Ron Birnbach
Fotografia: Torsten Breuer
Montagem: Ueli Christen
Música: Heiko Maile
Figurino: Ivana Milos.
Direção de arte/cenários: Knut Loewe/Tilman Lasch.
Produção: Christian Becker.
País: Alemanha
Ano:2008