TOP OF THE LAKE

                                                 
Uma pequena cidade, tranquila, perfeita, uma cidade daquelas para ficar entediado. Essa cidade se chama Twin Peaks e fica a nordeste do estado americano de Washington. David Lynch há tempos desperta esses demônios. Ele fez isso com Veludo Azul (Blue Velvet, 1986) e depois levou o estilo para a televisão, com a famosa série onde Laura Palmer era o objeto das investigações do detetive particular Dale Cooper. O cineasta introduziu na televisão dois elementos fundamentais de sua cinematografia: a podridão que se esconde atrás do que é aparentemente sereno e o grandioso, o sublime, a paisagem fantástica. 


Ao contrário das visões New Age de hoje em dia, e daquelas que falam da Mãe Natureza e todo esse monte de coisas cheias de luz, Lynch nos aproxima de uma ideia mais obscura da terra e da paisagem. Digamos que ele nos confronta com a natureza que nos aproxima do dionisíaco, de uma imagem da terra profunda, misteriosa. A natureza como o lugar onde se movem forças desconhecidas que o ser humano nunca compreenderá. Essa obscuridade da terra se equipara à obscuridade desta alma, essa outra floresta desconhecida.

Seguindo com essa herança, surge a série de sete episódios Top Of The Lake (2013) da diretora neozelandesa Jane Campion (O Piano – The Piano; O Brilho de Uma Paixão – Bright Star). Assim como em Twin Peaks, a série começa com uma ruptura no meio de uma paisagem. Enquanto Laura Palmer aparece flutuando em um rio, em Top Of The Lake uma garota de 12 anos chamada Tui (Jacqueline Joe) aparece caminhando perdida pelos arredores de um lago que fica ao redor de uma cidade chamada Paradise. Como se vê, a água, em ambas as séries, é o ponto de partida. A água, o grande olho da natureza, a grande testemunha da atrocidade. O nome do lugar, Paradise (paraíso), também nos faz pensar nesse paraíso natural que era a cidade de Twin Peaks, lugares que aparentemente têm sidos tocados pelo mal. Mas já sabemos o que aconteceu com Adão e Eva, já sabemos da serpente. Mas voltemos à série: Tui tentou se afogar neste lago ao sul da Nova Zelândia; Tui foi estuprada. Assim começa o mistério e então aparece a figura da lei: no caso da série de Jane Campion, é a detetive relativamente inexperiente e novata, Robin Griffin (Elisabeth Moss, deMad Men). Também há outra personagem que não parece ter grandes funções na trama, mas nem por isso é menor: falamos de GJ, interpretada por Holly Hunter, a atriz com a qual Campion conheceu as alturas da fama em O Piano (The Piano). GJ é uma mulher enigmática que sai por aí dizendo que está morta, fumando sem parar e acompanhada de um grupo de mulheres que afirma estar lá para encontrar a reabilitação após serem abusadas ou abandonadas. GJ e suas mulheres não são fáceis e logo entram em choque com o traficante da região, o terrível Matt Mitcham (Peter Mullan). Claro, não será fácil. A detetive, entretanto, não tem muito futuro. Em uma reviravolta, ela descobre que Tui é filha de Mitcham, o traficante. A droga e seu poder estão em toda parte. A droga como um elemento profano, corruptor. A droga, cabe dizer, em algum momento da cultura foi um elemento sagrado para entrar em contato com os deuses, com os deuses que estavam na floresta, na selva, na natureza. Ainda hoje é assim para algumas tribos do interior da Amazônia. Mas, neste caso, a droga é o contrário, uma perversão. Mitcham é um cara perigoso, um homem que chegou há tempos no paraíso e se dedica a destruí-lo. Não se deixe enganar. A paisagem é serena, mas também fria... como certas versões do inferno. A detetive não só vai encontrar um importante detalhe, como também acontecerá um novo fato: Tui vai fugir das mulheres furiosas e, durante uma manhã, desaparecerá sem deixar vestígios. Em seguida, finalmente, tudo se tornará mais complicado. Ou melhor, tudo irá para o inferno.
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